Thursday, March 17, 2011

O sábio e o tolo.

Todo início de ano, traçamos objetivos para conquistar alguma coisa que queremos muito e que, evidentemente, ainda não possuímos. Ou, se possuímos, ainda não nos satisfaz na quantidade ou qualidade que queremos. No início de 2010, após três anos dedicados a um mestrado, senti que era hora de buscar um retorno financeiro maior em meu trabalho. Até então, vinha fazendo escolhas com vistas a ter uma nova profissão (como professor) e, tendo conseguido isso, procurei aprofundar minha formação. Para tanto afastei-me do mercado publicitário depois de dez anos, justamente no meu melhor momento profissional. Tinha ganhado um prêmio de repercussão nacional e outro de destaque no estado, mas preferi partir para a área docente, mesmo sabendo que, fazendo isso, abriria mão de um salário que até então não havia alcançado.

Nunca me arrependi dessa decisão e, revendo-a com os olhos abertos pelo colírio do tempo, penso que foi uma escolha sábia. Mas se o carinho e o aprendizado que recebi dos meus alunos e professores preencheram minha alma nesses últimos 6 anos, comecei a sentir os bolsos mais vazios, especialmente após o fim do mestrado, quando tive mais tempo livre. Não que eu tenha passado fome ou qualquer dificuldade desse tipo – longe disso, graças a Deus – apenas vinha me ressentindo de não poder fazer mais por minha família e por mim mesmo. Tinha muitos sonhos que ainda queria realizar e assim, quando chegou 2010, pensei: “nesse ano, quero ganhar melhor”.

Consegui. Não fiquei milionário, mas recebi uma proposta de emprego quando mais precisava (minhas aulas tinham sido reduzidas temporariamente a ¼ do normal e, com isso, meu salário caiu bastante). Voltei a trabalhar como publicitário, conciliando as duas ocupações. No semestre seguinte, meu número de turmas aumentou, o que me deixou mais tranquilo em relação à grana. Pude viajar com minha família, investi em nosso conforto e consegui terminar os meses antes do meu salário. Fiz até um “pé de meia” que, no final do ano, ajudou bastante.

Então, quando chegou 2011, pensei: do que eu gostaria agora? Certamente que eu pretendia manter a minha tranquilidade financeira. Mas com isso já estabelecido, eu poderia me concentrar em outros propósitos. Daí, duas coisas vieram à minha mente. Por um lado, resolvi me comprometer um pouco mais com a minha saúde. Queria emagrecer, fazer as pazes com o espelho e não ficar mais dependendo de remédios para controle de asma, azia etc. Sou muito novo pra isso.

Por outro lado, lembrando dos aborrecimentos que tive no ano passado, concluí que me faria bem ser uma pessoa mais sábia. Se eu escolhesse mais sabiamente as minhas lutas, não me machucaria à tôa, nem criaria inimizades. Se eu soubesse controlar o meu ego, essa serpente sorrateira que destila veneno na alma, enxergaria mais claramente as coisas. Seria mais humilde e sensato. E se eu aprendesse a não dar importância àquilo que não merece, carregaria menos peso no coração e estaria mais leve para curtir o que a vida oferece de bom.

Fiquei pensado nisso e percebi que sabedoria é um bem muito mais valioso do que o próprio dinheiro, já que ele vem naturalmente, na hora certa, como resultado de escolhas sábias. E assim também é com a saúde, um benefício que só usufrui aquele que tem a sabedoria de se cuidar e de evitar os excessos e os riscos desnecessários. Procurar ser uma pessoa mais sábia, portanto, foi a minha grande decisão para 2011. Mas peraí: como assim “ser uma pessoa mais sábia”? Olha a serpente aí de novo me fazendo acreditar que eu já sou aquilo que ainda estou longe de ser.

Afinal, em que momento eu poderei olhar pra mim mesmo e afirmar que sou uma pessoa sábia? E supondo que esse dia chegue, não seria um tanto arrogante dizer isso? Continuei refletindo e percebi que a sabedoria não é algo que possa ser conquistado. Deve ser, isso sim, construída. A sabedoria, a bem da verdade, é uma disciplina. Uma virtude que se desenvolve no presente, que se reconhece no passado e se recompensa no futuro. Ninguém pode afirmar que é sábio, porque no instante seguinte já corre o risco de se desmentir por algum gesto ou palavra tola. Seria tolice, portanto, alguém afirmar ou mesmo acreditar que tem sabedoria. Só podemos nos considerar realmente sábios por aquilo que já fizemos e que depois se mostrou acertado. Se conseguirmos acertar mais do que errar em nossos dilemas, teremos uma vida melhor e talvez os outros até nos chamem de sábios no futuro. Nessa hora, convém manter a serpente ainda mais vigiada.

Agora, toda vez que passo por algum momento difícil, peço a Deus sabedoria para saber a atitude certa a tomar. Assim já consegui evitar algumas situações de stress que, fossem pouco tempo atrás, poderiam me prejudicar. Mas tenho ciência de que não terminarei 2011 podendo afirmar que alcancei meu objetivo, como aconteceu no final do ano passado. Não seria sábio dizer isso. Ficarei feliz simplesmente se eu puder olhar no espelho e reconhecer uma pessoa que conseguiu ser melhor nesses últimos 12 meses. O que me lembra da minha estupidez, pois ainda tenho que iniciar minhas caminhadas e retomar minha dieta.

1 comment:

Thales Rangel said...

Daniel,

Por um tempo achei que o término da faculdade e a vida em outra cidade teria encerrado o meu ciclo de aprendizado com você.

Porém, todo discípulo recorre ao mestre quando se sente um pouco perdido, por isso acabo vindo aqui às vezes, pra aprender um pouco mais. Mesmo longe você continua a me dar grandes lições através do seu amigo imaginário, o grande Jeremias Boob.

Por isso, quero muito te agradecer pela lição de hoje. Era tudo que eu precisava ler nesse momento da minha vida.

Obrigado, mestre!

Thales Rangel