Wednesday, December 22, 2004

Minha filha é um merchandising ambulante

Não é corujice, nem mania de publicitário (muito provavelmente são os dois). O fato é que minha filha de 3 anos fala umas coisas que bem que dariam comerciais. Outro dia, por exemplo, estávamos a caminho da escolinha. Aproveitando que eu estava de férias, disse que estava querendo passear com ela depois da aula.
- Onde, papai?
- Sei lá, filha. Que tal num shopping?
- Quero ir no BH.
- No BH? Mas por que não pode ser em outro?
- Porque só lá tem carrossel.

Imediatamente, minha mente completou:
- Só no BH você encontra aquilo que você quer.

Dias mais tarde, ela teve outro insight. Foi abrir o armário da cozinha e achou uma caixa de cereais. Pronto. Lá veio o “merchan:”
- Sucrilhos! Eu adoro Sucrilhos!
E eu, inevitavelmente, completei:
- Cereal é Sucrilhos, o original

Depois, a cena praticamente se repetiu. Eu estava assistindo TV e me aparece aquela menininha com cara de levada, o rosto todo lambuzado, comendo leite condensado de colherzinha.
- Humm… leite moça é tão gostoso.

E o complemento veio na hora:
- Leite Moça. Desde pequeno a gente sabe que é bom.

Esses são só alguns exemplos. E como situações assim estão sempre acontecendo, estou pensando seriamente em começar a andar com uma câmera. Quem sabe eu não começo a cobrar esse tipo de merchandising? Afinal, onde já se viu colocar essas coisas na cabeça das crianças? Esse povo que trabalha com propaganda é fogo…

Friday, November 26, 2004

Remédios e crianças

Tem horas em que ser pai não é fácil. E é justamente nos momentos difíceis que a gente aprende as maiores lições de vida. Nesses dias mesmo, aprendi mais uma. Minha filha de 3 anos vem passando por uma incômoda infecção labial, que segundo o pediatra, muitas crianças costumam desenvolver nessa idade. Em conseqüência disso, ela nem está se alimentando direito, pois mal consegue mastigar. Daí você imagina como é difícil escovar os dentinhos dela, ou manter uma mínima higiene bucal. Agora, some tudo isso com a chegada de uma nova irmãzinha. Com certeza, além da dor que ela sente, há também aquela “manha” esperada de quem era rainha e agora tem que dividir o trono.

Aí começa a dificuldade: a gente tem que ser compreensivo pelo momento que ela está passando, mas não podemos deixar de tratá-la, apesar de todo choro e toda birra. Então, quando chega a hora dos remédios, não sei se o sofrimento maior é dela ou meu. Às vezes preciso segurá-la à força, enfrentando seus gritos e contrariando seus pedidos, e isso me corta o coração. Meus pais devem ter passado pela mesma situação, mas só agora compreendo como foi difícil. Aliás, confesso que segurar meu bebé para que ele fosse vacinado não me doeu tanto quanto segurar a minha filha para lhe dar o remédio. Principalmente porque ela já tem consciência do que vai acontecer, quando preciso segurá-la no meu colo.

Da última vez, depois de medicada, ela explodiu: “que vergonha!” Não sei se ela teve consciência do que disse, mas me assustei bastante. Eu me vi como o pior pai do mundo, um bruto que imobiliza uma criancinha só para dar um remédio. Claro que não foi isso. Mas foi isso que eu senti. Era como seu eu estivesse ferindo a dignidade da minha filha, daí a vergonha que ela teve. E eu, ainda mais. Sei que estava certo, mas nunca mais me esquecerei daquela cena. Sem derramar nenhuma lágrima, eu chorei. Foi ali que eu entendi, mais do que nunca, que ser pai é fazer o melhor pelos filhos, mesmo contra a vontade deles. Mesmo deixando cair a máscara de super-herói.

E foi assim que eu aprendi outra lição, mais importante ainda: muitas vezes, a gente também age como crianças, rejeitando os remédios amargos que a vida nos impõe. Nessas horas, vou me lembrar, por maior que seja minha vergonha, que também não é fácil pro nosso Pai lá de cima ajudar a gente a curar nossas feridas e a crescer como pessoa.

Hoje, agradeço muito a Deus e a meus pais. Amanhã, espero que minha filha faça o mesmo.


Thursday, October 14, 2004

MELOSQÜÊNCIA, A ARTE DA PROSOPOPÉIA BABILONESCA.

Quem trabalha em propaganda sabe: tem horas em que a gente tem que falar muito, sem ter absolutamente nada pra dizer. É triste, mas é verdade. E isso não acontece só com os redatores, não. Os diretores de arte também sofrem. Quantas vezes não tem foto, ilustração, produto, nem oferta pra “enfeitar” (ou enfeiar) um anúncio? Aí é o tal do “seja criativo”. Dá vontade de matar. Afinal, não dá pra tirar o coelho da cartola, se o coelho não estiver lá. E, se algum mágico disser que faz isso, não acredite, o Mister M já provou que é mentira.

Na propaganda não é diferente: a gente também não faz mágica, no máximo cria ilusões. É aí que entra esse recurso maravilhoso que eu costumo de chamar de “melosqüência”. Gostou do nome? Infelizmente, não fui eu que inventei. Nem “prosopopéia babilonesca”, criação de outro amigo meu. Mas foi idéia minha juntar as duas expressões para batizar esse conjunto de técnicas extremamente sofisticadas. Normalmente, como são os redatores que escrevem (dãaaa), eles é que costumam empregá-las com maior freqüência. Veja um exemplo: para anunciar um automóvel, em vez de dizer simplesmente “Vendo Automóvel”, você diz:

- Vendo maravilhoso automóvel (o adjetivo ajuda a valorizar o produto e justificar o preço)
- Quase zero (na verdade, já rodou 99.999 km, então, daqui a pouco, o odômetro zera)
- Único dono (já pertenceu a 19 proprietários, mas atualmente é só de um, logo, a informação é verdadeira)
- Nunca bateu (só apanhou)
- Carro do ano (1973, mas isso você não precisa mencionar)
- Preço super vantajoso (para o vendedor, claro)
- Condições imperdíveis (20 / 40 / 60 segundos)

Agora, vamos ver como o anúncio ficaria: “Vendo maravilhoso automóvel, quase zero, único dono, nunca bateu. Carro do ano. Preço super vantajoso, condições imperdíveis.” Ficou ou não ficou atrativo? E olha que nesse exemplo eu só usei algumas técnicas da prosopopéia babilonesca. Digamos que foi “Melosqüência” grau 1. Quer saber outras regras? Lá vai: se o texto ficou curto, procure inserir algumas palavras longas que dão sentido de reforço. Tipo “exclusivamente”, “especialmente”, “extremamente” (uma das minhas preferidas). Mas cuidado para não repetir a mesma palavra, nem usar muitas parecidas no mesmo parágrafo, senão fica muito óbvio.

Outra coisa: procure expressões sofisticadas, tipo “sofisticadas”, para dar um upgrade no texto. Ah, como você vê, palavras em inglês também funcionam bem. Elas demonstram o know-how do cliente. Como recurso de estética, você também pode usar um italizado nessas expressões. Isto confere uma nuance altamente chic ao texto, maximizando a credibilidade do produto ou serviço em questão.

Evite também frases extremamente curtas e, nesse propósito, use e abuse dos sinônimos, pois assim você consegue alongar imensamente um período que poderia ser dito utilizando-se pouquíssimos vocábulos, como neste próprio parágrafo, que poderia ser resumido simplesmente dizendo-se: “evite frases curtas”.

Bom, depois de tudo isso, acho melhor parar por aqui. Claro que existem ainda outras regras para se praticar bem a arte da melosqüência. Mas prefiro comentá-las numa outra oportunidade. O importante é que agora você já conhece os princípios básicos da prosopopéia babilonesca e pode aplicá-los e, mais importante ainda, pode reconhecer quando alguém está utilizando isso contra você. Fique muito atento nesses casos. Quando bem utilizada, essa arte funciona muito bem. Prova disso é que você está aqui até agora, lendo esse texto enorme sem conteúdo nenhum.


Daniel Macieira


Friday, October 08, 2004

Zero a Zero

O treino havia começado. Os jogadores estudavam passes, enquanto o treinador repassava as instruções. Para ele, nada de novo: somente os fundamentos básicos do jogo. O esquema também era clássico: o 4-4-2, idealizado pelo mestres da bola e seguido de Genebra ao Amazonas. Uma língua falada e consagrada nos gramados.

Alguns jogadores arriscavam chutes, sob o olhar arbitrário do professor. Eis que surge uma oportunidade de gol. Um dos atletas percebe. Ávido para conquistar um lugar entre os titulares, levanta a mão pedindo o passe. Recebe e, cheio de entusiasmo, dispara como centroavante rompedor. Senhor de si, já tinha toda jogada desenhada na cabeça. Sabia antecipadamente os dribles e as fintas que deveria buscar em seu repertório. Imaginava-se escapando dos zagueiros, livrando-se do goleiro e estufando as redes.

Mas antes que ele desse o segundo passo – priiiiiiiiiiiiii - o gol da rodada desaparece nas nuvens. Ressentido como escritor de quem roubaram a poesia, o atleta recebe a repreensão do treinador. “Menos, meu filho. Agora volta pro meio e repete a jogada do jeitinho que eu mandei.”

O jogador obedece. Se discutir com o treinador não sai do banco de reservas. “Vai ver ele é daqueles que só jogam pelo empate.”

Tuesday, October 05, 2004

Construindo.

Jeremias Boob

Você já pensou como acontece a inspiração? De onde ela vem? Como é que uma idéia surge assim de mansinho e, pouco a pouco, vai tomando forma? É a mesma coisa com um texto. Pra muita gente, o mais difícil é começar. Certa vez fiquei conjecturando (palavra feia, puxa!) sobre o assunto. Acho que escrever é mais ou menos isso que está descrito nessa poesia. Você procura a danada da inspiração, tenta por aqui, tenta por ali. E aí...

Bem, o melhor é você ler. E, se estiver inspirado, deixe sua opinião.



CONSTRUINDO.

Abri meu caderno de prosa, mas não tinha nada. Prosa, verso, palavra alguma. Puro vento. Comecei a tateá-lo, feito cego sem bengala. Uma coisinha aqui, outra ali. O substantivo abstrato vai ficando concreto. Ôpa! De repente achei uma parede. É por aqui que eu vou.

Thursday, September 30, 2004

A volta do lanterninha

Sempre gostei de ir ao cinema. Apesar de não ser nenhum cinéfilo fanático, nem crítico antipático, costumo assistir meus filminhos até com bastante frequência. Por isso, percebi uma coisa chata que vem acontecendo. O comportamento do público mudou. As pessoas estão perdendo a admiração e até mesmo o respeito pela sétima arte. Posso até estar errado ou exagerando, então pense comigo. Antigamente, ir ao cinema era um programa que tinha muito mais glamour. As pessoas se arrumavam, perfumavam e se encontravam especialmente pra isso. Naquelas salas grandes como as do Cine Palladium, a gente se acomodava e, naquelas duas horas mais ou menos, mergulhava na história que se passava na telona. Me lembro, mais de uma vez, das pessoas aplaudirem o filme no final, como se o diretor ou os atores pudessem receber pessoalmente as palmas. Ali, no escurinho do cinema, chupando drops de anis e longe de qualquer problema, acontecia no máximo uma conversinha ao pé do ouvido. Claro que havia os chatos, mas não era como hoje.

Naquela época, tínhamos duas figuras clássicas dentro do cinema. Uma era o baleiro, carregando sua bandeja de chocolates e chacoalhando uma caixinha de mentex. A outra era o saudoso lanterninha. Lembra dele? Aquele senhor que indicava o lugar para as pessoas depois que as luzes se apagavam. Aquele mesmo que iluminava os namorados mais afoitos (Yes! I saw the light!), corrigia os folgados que colocavam o pezão na poltrona da frente e, principalmente, inibia os insuportáveis que ameaçavam atrapalhar o programa dos outros. E não é que dava certo? Quem não tinha medo, ou pelo menos vergonha de tomar um clarão?

Aos poucos, as coisas mudaram. Começou com a popularização do vídeo-cassete. Disseram que o cinema estava indo pra dentro de casa, o que na prática era bobagem, já que o cinema continuava sendo diferente, especial. Lá não tinha telefone tocando, gente passando em frente à TV, cachorrinho fazendo xixi no tapete, nem mamãe chamando pro lanche. O cinema ainda era o Cinema, graças a Deus. Depois é que aconteceu o pior: levaram as casas para dentro do cinema. Explico: a decadência das grandes salas e o surgimento do cinema de shopping criou um novo tipo de público. O das pessoas que acham que estar em uma sala de cinema é o mesmo que entrar numa loja ou restaurante. Assim o filme deixou de ser uma opção de lazer e cultura, transformando-se num mero produto de consumo. Ou seja: o cinema virou fast-food.

Hoje, o que acontece é que as pessoas não se importam tanto com aquilo que estão assistindo. Simplesmente acham que, pagando o ingresso, podem entrar e agir como quiserem. E o pior é que agem: inundam as salas de lixo e pipoca, atendem o telefone celular sem nenhuma cerimônia, conversam, riem, fofocam, tiram até o sapato. Sentem-se literalmente em casa, criando um desconforto tão grande que nem parece que elas são minoria. Aliás, uma minoria muito atrevida, diga-se de passagem. São pessoas que realmente não se importam em incomodar as demais e chegam mesmo a se divertir com isso. Quanto mais irritam os outros, mais se tornam provocativas.

Certa vez, por exemplo, na última sessão de um filme no Diamond Mall, havia uma mulher conversando em alto e bom tom. Certamente era uma pessoa sem segredos, pois não fazia a mínima questão de falar baixo, pelo contrário. Seu acompanhante, a muito custo, tentava conter a tagarela que já irritava muitas pessoas, inclusive eu. Algumas pediam silêncio, chiavam, reclamavam e, quanto mais isso acontecia, pior ficava. "Outro dia, no Minas Shopping, foi a mesma coisa." dizia ela, sentindo-se ultrajada em ser criticada pelo seu comportamento. Vejam só que absurdo. As reclamações continuaram e lá veio ela com a sua justificativa injustificável: "Eu paguei o ingresso e tenho todo o direito de conversar"... Nessas alturas, meu sangue já estava em ebulição. E o filme, que era bem legal, acabou perdendo muito da sua graça. Então, assim que as luzes se acenderam, onde estava a mulher? Todos olharam em sua direção e ela já tinha saído. Naturalmente, um pouco antes do final. E daí para o filme?

Numa outra oportunidade, algo parecido aconteceu. Estava assistindo "A Fuga das Galinhas", uma animação em massa de modelagem muito bem feita. A trama, pra quem não viu, é muito interessante e capaz de envolver tanto adultos quanto crianças. Quando fui ao cinema, querendo evitar um pouco o público infantil, escolhi à última sessão no Shopping Cidade (não venha me dizer que o problema era o perfil do público, afinal, não viu o caso anterior?). Até logo depois do início do filme, havia poucas pessoas na sala. Mas a tranquilidade foi-se embora com a chegada de um bando pirralhos. Como se estivessem em sala de aula, eles se sentaram na última fila gritando, conversando e nem dando bola pro filme. Junto com eles estava um rapaz que, em vez de orientar, sentia-se o professor. Mais um ponto contra o Cinema.

Tudo isso me faz pensar: por que não trazem o lanterninha de volta? Além de criar novos empregos, tenho certeza de que as pessoas ficariam mais civilizadas. Se não desse resultado, aí sim poderíamos tentar soluções alternativas, como trocar a lanterninha por um fuzil AR15 com mira laser. E com sinalizador também, é claro, para não atrapalhar o filme. Outra idéia seria instalar um botão eject nas poltronas de cidadãos indesejáveis. Ou então, quem sabe, transformá-las logo numa cadeira elétrica. Aí sim, o programa ficaria emocionante.

Friday, September 24, 2004

Casamento é para sempre

Esse texto eu fiz especialmente para minha esposa. Dia 25/09, completaremos 5 anos de casamento (e no fim do ano, 10 anos de namoro). Amor, que o nosso relacionamento continue sendo cada vez melhor.


CASAMENTO É PARA SEMPRE.

Para sempre ter
do que se encantar.
Para se alegrar
com o que vier.
Para se plantar,
ter o que colher.
Para sempre dar,
para receber.
Para perdoar,
para se aprender.
Para se escutar,
para se entender.
Sempre se encontrar,
nunca se perder.
Para despertar
e adormecer.
Para namorar
e fazer nascer.
Para sempre amar,
quanto mais viver.

Monday, September 20, 2004

O COMPLÔ

- Pai.
- Que foi, filho?
- A partir desse mês, minha mesada vai ser dobrada, tá?
- Hã? Como assim?
- Dobrada ué. O senhor vai me dar duas vezes o dinheiro que eu ganhava.
- Quê isso, menino? Que brincadeira é essa?
- Num é brincadeira não, pai. Tá tudo certinho. Eu, o Juninho e a Pati já combinamos.
- Os três? Então agora é assim? Os filhos definem a mesada, os pais pagam e pronto?
- Isso, você entendeu.
- Sei. E ninguém me pergunta antes se pode? Aposto que também não falaram nada com a sua mãe, né?
- Pra quê, pai? A gente fez uma votação e nós três achamos que tinha que ter esse aumento. Demogracia não é assim?
- Democracia, menino. E de onde você tirou essa idéia?
- Vi na televisão, ué. Outro dia não mostrou os deputados combinando de aumentar o salário deles?
- É… mas o que é que isso tem a ver?
- Ah, pai. Se eles podem, a gente também pode.
- Nada disso, que coisa absurda! Daqui a pouco vocês vão querer auxílio-merenda, auxílio-uniforme, auxílio-videogame, verba adicional pra passeio no parque, lanchonete, cinema e por aí vai.
- Pô, pai! Boa idéia. Vou lá falar com os meninos.
- Peraí, eu não concordei com nada disso. Não vai ter aumento nenhum de mesada. E já chega dessa conversa.
- Ah, paiê. Ninguém reclamou dos deputados…


P.S. Escrevi esse texto no ano passado. Mas acho que vou republicá-lo em breve, substituindo "deputados" por "vereadores". Quer apostar?

Thursday, September 16, 2004

PORQUE EU NÃO VOU FAZER CONCURSO PÚBLICO.

Foi-se o tempo em que as pessoas entravam numa empresa e faziam carreira. Meu pai foi uma delas. Começou a trabalhar num banco com apenas 14 anos de idade, se não me engano. Foi officce boy, auxiliar de escritório, assistente de não-sei-o-quê, tornou-se caixa, sub-gerente, gerente, supervisor e – ufa! – aposentou-se finalmente depois de trinta anos de serviço. Essa foi a escolha da vida dele e, se qualquer pessoa perguntar se valeu a pena, ele certamente dirá que sim.

O meu sogro, por sua vez, optou por outro caminho. Fez um curso técnico e seguiu carreira na Petrobrás. Durante vários anos, trabalhou na Bacia de Campos. Eram 15 dias em campo (oops… desculpe o trocadilho) e outros 15 dias em casa. Com certeza, não foi uma vida fácil: longe dos filhos, da esposa, dos amigos. Mas se fizermos pra ele aquela mesma pergunta (eu já fiz), a resposta vai ser a mesma: valeu a pena.

Agora, onde é que eu quero chegar? Nas recorrentes sugestões do meu pai, minha mãe, meu sogro, minha sogra, meus tios, primos, amigos, além de alguns intrometidos para que eu faça concurso público. Com o devido respeito a todos eles (e a você também, caro leitor), QUE SACO!

Sei que essas sugestões são frutos de boa vontade. Mas e a minha vontade, não conta não? Para que você entenda melhor, vou explicar porquê tenho tanto "irc" desse assunto. Quem sabe pelo menos você me dá razão?

Desde pequeno, gostava de desenhar (valeu, Daniel Azulay). E, antes mesmo de pensar em vestibular, meu irmão já tinha me sugerido estudar publicidade. Aquela foi a primeira boa idéia da minha futura profissão. A única coisa é que eu achava que seria diretor de arte (aquele cara que “desenha”, sabe como é?). Mas isso foi só até eu entrar num curso de desenho publicitário e sacar que o meu negócio mesmo era ser redator. Não disse antes, mas também gostava muito de escrever. Aliás, na quinta-série tinha ficado em segundo lugar num concurso de poesia da escola (o troféu tá lá em casa, num lugar qualquer).

Anyway, o fato é que desde muito cedo eu já gostava de publicidade e tinha escolhido esse ramo. Nunca tive nenhuma dúvida. Pelo menos, até entrar para o mercado de trabalho. Só pra dar uma contextualizada, Minas Gerais não é lá um grande pólo da propaganda, embora seja um dos maiores mercados econômicos nacionais. Sem me aprofundar muito nesse assunto, a situação aqui (como também em São Paulo, Rio e no resto do Brasil) não está das melhores. E isso já faz um bom tempo. Consequência: do ponto de vista dos profissionais, está muito difícil se manter e, principalmente, ter uma expectativa de longo prazo atuando nessa área.

Como escolhi não sair de Belo Horizonte, ao contrário da maioria dos redatores e diretores de arte daqui, que sonham em receber uma proposta para pular fora, fazer o nome e depois voltar por cima, tive que arcar com as consequências. Aí é que entra a história dos concursos públicos. Toda vez que eu começo a reclamar, dizendo que pretendo mudar um pouco de rumo, aparece alguém pra me dizer: “Por que você não faz o concurso do TRE? Ou da Petrobrás? Ou do Tribunal de Contas?” E por aí vai. Só que ninguém pergunta se eu mesmo já não tenho alguma coisa em mente. Eu tenho, pô!

Pode ser por idealismo, ou até por imaturidade (se for, saberei no futuro). A questão é que não vou fazer concurso público. Pelo menos agora. Ponto final. E sabe porquê? Porque eu gosto de atuar em comunicação. Amo. É uma escolha que pra mim compensa bastante. Eu adoro escrever, ter idéias, desenvolver essas idéias e ver que elas estão dando certo. Se/quando eu tiver realmente que escolher outra coisa, ninguém fará isso por mim. Primeiro, porque sou eu quem vai largar tudo e partir pra outro emprego completamente diferente. Segundo, porque esses concursos não têm nada a ver comigo. Não me vejo de jeito nenhum bancando o araponga na Polícia Federal, ou então conferindo urnas numa repartição do TRE. E terceiro, porque ainda tenho várias outras escolhas que compensam, dentro (ou mais perto, pelo menos) daquilo que eu gosto de fazer.

Eu escolho trabalhar em alguma coisa que me dê satisfação (mesmo que ela não seja plena), porque o trabalho ocupa a maior parte do meu dia. E se esse trabaho não me preencher, minha vida será um saco vazio. Agora, a razão mais importante de todas: eu faço essa escolha, porque quero me sentir bem comigo mesmo. Porque eu quero chegar em casa e ficar bem com minha família. Sem pensar que é só por causa dela que estou em algum emprego maldito, que eu detesto, mas que me dá mais segurança e uma grana boa no fim do mês.

Eu sei que eu não vou ter uma carreira, como meu pai e meu sogro. Especialmente trabalhando em propaganda. Mas o que me importa, o que acredito e o que escolho é isso: trabalhar em alguma coisa que me realize, porque só assim a minha felicidade e a felicidade da minha família também poderão se realizar. Entendeu agora porque é que eu não vou fazer concurso público?

Friday, September 10, 2004

Bom dia.

Esse texto eu fiz para minha primeira filha, quando ela tinha lá pelos seus 5 ou 6 meses. Daqui a pouco vou ter que escrever mais um: logo, logo outro neném vem por aí.


BOM DIA.

Abrem-se os olhinhos inchadinhos de sono. Esticam-se os bracinhos, tentando alcançar o inalcançável. Misturam-se pernas, braços, pescoço. Um bebê bolinha aninhando-se na manta.

Surge uma mãozinha no protetor do berço. Ouve-se um bom dia enrolado. Um chamado carinhoso, numa língua que ainda se descobre. Aparece mais uma mãozinha. Dedinhos pequeninos que se firmam.

Um rostinho curioso, um sorriso. E o sol nasce.

Monday, September 06, 2004

Do outro lado do lápis.

Do lado de cá estou eu.
Na ponta de lá, ainda não sei.
Depende mais de mim ou mais dele? Ou dela, sei lá…
Onde está minha história?
Cadê meus personagens?
Quem é que vai aparecer no papel? Ou na tela, sei lá…
Um herói, um profeta, um carrasco, o quê?
E de onde ele (ou ela, sei lá…) vem? Pra onde vai?
Pra fazer o quê? Por quê? Como? Quando?
Eu não sei.
Só sei que detesto esse negócio de tema livre.



Friday, September 03, 2004

Ah se pra tudo na vida tivesse um mídia.

Quem trabalha com propaganda sabe a importância do profissional de mídia (para quem não trabalha, é ele quem seleciona os melhores horários, programas, dias, locais, enfim, é o mídia quem escolhe a melhor hora e o melhor lugar para se fazer uma divulgação). Por isso, existe uma data específica para se homenagear esse profissional no mercado da propaganda, o dia 21 de junho.

O texto abaixo foi a homenagem que eu fiz para duas mídias muito legais com quem tive a oportunidade de trabalhar: a Renata e a Tininha. Um abração para elas e também para os outros mídias do mercado.


AH SE PRA TUDO NA VIDA TIVESSE UM MÍDIA.
Ah, se pra tudo na vida tivesse um mídia…

Imagine só: você conseguiria sempre a melhor vaga para o seu carro, ocuparia o melhor lugar da mesa na hora do jantar, ninguém se sentaria na cadeira em frente à sua no cinema. Você seria sempre o primeiro da fila, assistiria aos shows no camarote vip, teria um lugar de honra nos estádios, presenciaria os grandes acontecimentos bem de pertinho. Sua janela faria vista para o mar e o seu quintal ficaria nas montanhas. Nenhum chato viajaria do seu lado. Nenhum amigo ficaria longe por muito tempo. O próprio tempo seria muito mais útil e você saberia direitinho o que fazer e quando fazer. Se pra tudo na vida tivesse um mídia, a gente aprenderia o que ele já sabe, melhor do que ninguém: que é preciso calcular bem nossos esforços para ocupar o lugar certo, na hora certa. Esse é o melhor caminho para se encontrar a felicidade.



Wednesday, September 01, 2004

A sorte não acontece por acaso.

Sorte e acaso são sinônimos no papel. Mas na prática são duas coisas diferentes. Apenas parecidas. Acaso é o imponderável. É simplesmente uma coincidência de situações que levam a um determinado fato. Você não espera que ele aconteça e, se acontecer, sua vida pode mudar para melhor, pior, ou continuar na mesma. Por exemplo: você encontra uma nota de 100 reais na rua. Mero acaso: você passava naquela rua, naquele instante, quando olhou para baixo e viu o dinheiro que alguém perdeu.

“Mas isso é sorte”, você vai discordar. Não é. Explico porquê: a sorte está ligada à bem-aventurança, à fortuna (não só financeira). Por isso, quando ela acontece, “amacia” nossa vida. Como o acaso, você também não a espera. A grande diferença é que você a procura. Sonha com ela. Deseja que aconteça. Você não anda vasculhando as ruas atrás de dinheiro. Mas sonha, por exemplo, em ganhar na loteria. Espera receber uma boa proposta de emprego. Deseja reencontrar uma pessoa querida que há tempos você não vê.

Nesse sentido, aprendi uma definição perfeita do que é sorte: “é quando a preparação encontra a oportunidade.” Existe uma parcela de acaso nesse conceito? Sim. Mas isso não é tudo. A outra metade depende de você. Não adianta acertar os números da megasena acumulada, se você não enfrentar a fila da loteria para registrar a aposta. Não adianta pintar a vaga para o trabalho, se você não estiver pronto para agarrá-la. E nem adianta você encontrar a pessoa que procura, se na hora H você não souber o que dizer.

Daí dá para tirar uma dedução muito importante. Em vez de ficar só reclamando da vida e deixar as mudanças por conta do acaso, a gente tem é que correr atrás da sorte. É ela que provoca as grandes transformações. Isso significa que não podemos ficar acomodados. Ao invés disso, precisamos pensar, planejar e agir em direção àquilo que pretendemos. Isso se chama ter um projeto de vida. Lembra daquele velho ditado popular “Deus ajuda a quem cedo madruga”? Pois é. “A voz do povo é a voz de Deus.”

Guarde isso na memória e no seu coração. E esteja sempre preparado para ser uma pessoa sortuda. Afinal, a sorte não ajuda quem está parado. Ela só dá um empurrãozinho para quem já está caminhando.

Tuesday, August 31, 2004

Branco

Segura seu pensamento que ele voa.
Pensamento é pássaro, paixão e fogo.
Antes que você pense, ele se apaga
e logo se incendeia em outro assunto.

Pensamento, em um segundo,
dá uma volta no mundo.
E o que todo mundo pensa,
de repente passa.

Passa o sentimento,
passa o momento,
passa o próprio pensamento.
Não fica nada.

Monday, August 30, 2004

Ainda bem.

Ainda bem que ainda tem gente com a coragem de enfrentar desafios.

Gente que não vê o tamanho do muro, vê só os raios de sol querendo despontar do outro lado.

Que bom que ainda tem gente desejando e querendo mais.

Gente que reclama, que incomoda enquanto os outros se acomodam.

Quisera que mais gente fosse assim.

Que mais gente acreditasse nos seus sonhos, em vez de ficar dormindo acordado e sem vontade de sonhar.

Quem dera se cada um fizesse um pouco, quando poucos é que fazem tanto, por tantos que não fazem nada.

Será que a noite é escura demais para que se ouse sair na rua?
A palidez das lâmpadas é melhor do que o brilho das estrelas?
Vale a pena a gente ficar trancado dentro da gente mesmo?

Que bom que ainda tem alguém gritando sozinho lá fora, chamando a gente pra sair da mesmice.

Que bom que esse alguém resolveu insistir, mesmo sendo chamado de chato.
Porque chato mesmo será, se ninguém se importar.

Ainda bem que ainda tem gente com a coragem de sonhar.




Friday, August 27, 2004

Telemarketing de Cemitério

Outro dia recebi uma ligação de telemarketing (mais uma) e comecei a pensar sobre os malabarismos que os atendentes têm que fazer pra conseguir falar com o cliente. Aliás, é desse ponto de vista que eu me coloco, quando ligam pra minha casa no horário do almoço. Nem sempre consigo almoçar em casa, mas quando dá, fica difíci dividir a atenção entre um suculento filé com fritas e a ligação de uma empresa sei-lá-quem, tentando me vender sei-lá-o-quê.

O pior é que muitas vezes os atendentes não têm o mínimo preparo. Não interagem com o cliente. Simplesmente iniciam um monólogo. Assim que você atende, eles fazem uma breve apresentação e perguntam se podem dispor de apenas um precioso minuto de sua atenção. Mentira deslavada, é claro, mas como o Globo Esporte está no intervalo mesmo, tudo bem. Só que aí é como se a gente desse o tiro de partida pra uma prova de 100metros rasos. O atendente quebra qualquer recorde e dispara a falar do produto, das vantagens, do preço super especial.

Você até tenta desclassificar o camarada: olha, infelizmente... só que ele se julga fera também nos 100m com barreiras: Mas espere! Não é só isso! E lá vai de novo com mais blá-blá-blá. Enquanto isso você já perdeu os gols do seu time, o vexame da seleção, a desculpa esfarrapada do Luxa, ao mesmo tempo em que seu bife está esfriando e as batatas fritas murchando. Finalmente você se livra e volta pra mesa. Mas antes que possa se sentar, toca o telefone de novo. Ai meu Deus!

ALÔ! Nesse momento sua voz já é bem diferente. Tipo Barry White acordando de ressaca. É um outro operador de telemaketing. Pensa que ele se assusta? Que nada. A bola da vez é um cartão de crédito classe A A TOP TOP SUPER SUPER. Uau! Pra mim? O atendente até que se anima. Mas aí você joga o balde de água fria. Mais fria, só sua comida. Olha, infelizmente eu já possuo dois cartões de crédito... Internacionais? Claro. Sem limite de crédito? Essa pergunta até que inibe, mas como o limite mesmo é o bolso, melhor cortar o mal pela raíz. Fica para uma outra oportunidade. Você também joga um blá-blá-blá e dessa vez tenta almoçar até um pouco mais feliz, afinal acaba de esnobar o cartão de quem não precisa.

Ring-ring-ring... O telefone é insistente demais. Agora um telemarketing que até assusta você: promoção do cemitério Bosque da Esperança. Caso verídico. A pessoa começa a falar e você vai percebendo que a coisa é séria. Tipo "pensar no futuro", "ter tranquilidade". Parece até que estou falando com um espírito. É isso, um testemunhal de quem conhece o produto. Nem dou o tiro de partida. No momento não estou interessado. Quem sabe mais tarde? Bem mais tarde, tomara.

O fato é que na minha opinião, tanto de cliente quanto de publicitário, alguns tipos de produtos e serviços não devem ser abordados desta forma. Venda de jazigos (o próprio nome já assusta, credo!) definitivamente é um deles. Existem outras mídias, outros meios de se chegar a uma pessoa sem invadir tanto a sua intimidade pra falar de um assunto que é, no mínimo, perturbador. Nesses casos, acho que não se deve ser tão agressivo. Pode-se despertar a consciência do público para o tema, mas deixar com que ele tome a iniciativa da compra.

Promoção do Bosque da Esperança? Pensei. O que será que eles davam? Túmulo de luxo com frigobar e ar condicionado? Compre um túmulo de solteiro e leve um de casal? Pague um e leve dois? Metade agora e a outra só no além? Irrrrr.... finalmente voltei para o meu bife, que agora tinha todo aquele estilo James Bond. Duro, frio e com nervos de aço.